Poesia

Deus nas ondas do rádio e da Tv

Dentre os esdrúxulos momentos televisivos de fuga da realidade para o entretenimento dos atrofiados de “subvida” (e aqui me incluo, fugindo da racionalidade), editados\veiculados a bel-prazer por “alienadores midiáticos”, uma performance chamou-me a atenção: um travesti desajeitado (e feio para o conceito de belo na mídia) soltou a voz e deixou jurados e plateia abismada. Na despedida, vencida a descrença e a rejeição ante suas feições, ainda deixou uma pérola: “Não julgue o livro pela capa, leia-o primeiro”.

Em meio a atual baixaria televisiva, vez em quando, ainda respira um antidoto para conter a atual regra de ibope televisivo, ou seja: “O ibope só sobe quando o nível desce”. E esta se aplica tanto na área do entretenimento de Tvs comerciais ou nos horários sublocados para programas evangélicos que se utilizam da miséria do povo (e da falta de informação) como trampolim para a ascensão de igrejas apocalípticas. Sem esquecer aquelas que já são donas de suas próprias emissoras.

No século XIX, através de jornais e boletins semanais, iniciou-se a presença evangélica na mídia impressa no Brasil. Para Deus entrar nas ondas do rádio tupiniquim foi apenas um pulo de pouco mais de um século. A massificação televisiva não tardou a “devorar” fiéis enquanto Deus era (e continua sendo) “vendido” para enriquecimento de entidades religiosas midiáticas – sempre mantendo discursos separatistas (cada uma com suas verdades absolutas) e tendo como foco principal o papel de tornar a sociedade menos violenta e mais igualitária. A Igreja Católica se manifestou muito antes quando, no século XV, o papa Inocêncio VIII escreveu o “Inter Multiplices”, considerado o primeiro documento de censura sobre a mídia, coibindo a circulação de ideias publicadas que iam de encontro à fé e aos bons costumes da sociedade.

No Brasil, estado de caráter laico, não caberia ao executivo conceder outorgas de rádio e TV, que são bens públicos, para segmentos religiosos; nem tampouco manter nos colégios disciplinas de religião. Agora, ainda que tardio, mas Louvável, porém nem sempre aceito, a didática da ética e cidadania no ensino fundamental vai substituindo e atenuando o dogmatismo religioso. Abrem-se novas portas para fuga do proselitismo entronado num Deus raivoso. É Deus sendo despido de conceitos medievais para novas vestimentas transcendentais.

O futuro promete uma nova geração de crianças não mais amedrontadas pelo dogmatismo de um inferno com fogaréus e capetas (matérias primas de pregadores), mas aprendendo novas concepções de que bons e maus hábitos se conceituam no “modus vivendi” baseado no conhecimento da ética e da cidadania. Se elas (homens do futuro) aprenderem que em toda vivência o excesso é que produz o "pecado", não haverá danos porque não haverá demasia nos atos, pois esta não existirá para suceder malefícios a outros. Portanto, o inferno sucumbirá! Infelizmente, na contramão – agora nas ondas da televisão -, um novo “boom” (neo)pentecostal se enraíza com antigos conceitos e firma seus pilares no medo e no servilismo do dízimo para o enriquecimento de espertos loteadores do reino do céu.
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Nos conchavos dos bastidores do quarto poder-mor, grades televisivas são planejadas para colocar o público na “Fuga do eu” ou “Fuga da realidade” através do “besterolismo televisivo” e o medo atávico do sobrenatural. Mais do que isso, o conceito de verdades absolutas de igrejas midiáticas mostra que, atrás da mensagem de Deus anunciada nos quatros cantos do mundo, está todo um processo de consumo através da televisão – seja ela vendedora de bens materiais ou lotes celestiais.

A mídia, que busca ibope através de formas pejorativas e desvirtuadas, deveria fazer uma releitura da apresentação do travesti no programa de calouros. O quadro (certamente planejado), por instante, mudou o conceito televisivo de que: “o que é belo é belo aos olhos e basta”.

Kal Angelus Kal Angelus Autor
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