Eu vi a cara da fome
e ela inda era menina
brincando de esconde-esconde
com inocência intestina
Não era de assombro a cara
era cara de menina
vendo as outras merendarem
da vidraça da cantina
Eu vi uma menina vazia
E um prato cheio de farinha
bicavam-se e nunca saíam
como dois galos na rinha
Eu vi dois olhos pidões
saltando de um menina
como se fossem feijões
voando panela acima
Tinha olhar de saca-rolha
o olho dessa menina
feito a menina dos olhos
de uma ave de rapina
Eu vi que a fome mastiga
nos dentes de uma menina
até saciar as tripas
e defecar na latrina
Eu vi a cara da fome
e ela tem cara assassina
mata feito uma infame
e morre feito menina